Como consegui uma folga hoje, vou postar tudo o que andei prometendo por aí. Acredito que assim como eu, muitos de vocês se interessem pela questão da homossexualidade e o modo como ela é vista no Japão. Pensando nisso um dia, deparei-me com este artigo do Japan Times que já é um pouco velho mas que achei muito interessante! Pelo que pesquisei, as questões políticas e comportamentais não mudaram muito desde então.
Tenho outros artigos, depois eu trago, para não saturar do tema.
É um texto bem grande, traduzi aos poucos, espero que alguém tenha ânimo para ler, rsrs, ou que pelo menos sirva como uma referência.
Gostaria de ler uns livros sobre o assunto “homossexualidade no Japão” (sim, eles existem e são citados aqui. Não, eles não estão traduzidos e muito menos nas nossas prateleiras, assim como a maior parte do bom material sobre questões e história LGBT. Uma pena.). Deixei a bibliografia do artigo original para quem se interessar.
Encontrando espaço no Japão gay (Jan. 17, 2006)
“Imperialismo da bandeira Arco-íris” conflita com os conceitos de “não pergunte, não conte”
Numa primeira vista, a vida homossexual no Japão parece bastante reprimida. Demonstrações públicas de afeto são quase nulas, homens gays japoneses frequentemente vivem vidas secretas e é difícil notar uma presença gay, a não ser ao se aventurar em Shinjuku Ni-chome, o “distrito gay” (“gayborhood”) de Tokyo.
Mas ao dar uma olhada mais demorada além da superfície social e cruzar as barreiras lingüísticas que cercam a palavra “gay”, o sistema no Japão muitas vezes oferece um ambiente mais tranqüilo para os homens que deitam com homens.
Para muitos, “gay” invoca imagens de homens homossexuais balançando suas bandeiras de arco-íris e orgulhosamente expressando-se com uma atitude “cheguei e sou gay” (“I’m here and I’m queer”).
Sob este entendimento estereotípico da vida gay, alguns estrangeiros acham que os homens japoneses que vivem em uma cultura gay silenciosa deveriam se liberar através de ações similares.
“Meu termo para isso é ‘Imperialismo da bandeira Arco-Íris’,” diz Greg Dvorak, um PhD americano, candidato ao Gender Relations Centre of the Australian National University (ANU) e um pesquisador visitante na Universidade de Tokyo.
“É como uma forma própria de colonização. A palavra ‘gay’ em inglês carrega muito mais bagagens culturais do que imaginamos. Isto inclui algumas pessoas mas exclui outras.”
“Existem muitos homens que se perguntados se são gays, dirão que não. Mas se perguntá-los se já fizeram sexo com homens ou têm desejos por homens, pode ser que digam que sim.”
Ser”gay” no Japão tem parâmetros totalmente diferentes do que tornou-se aceito nas culturas ocidentais majoritarias.
A palavra em si foi importada após o término da Segunda Guerra Mundial, quando os soldados americanos procuravam relações sexuais na rua com mulheres ou homens japoneses.
Pouco tempo depois, um dos primeiros bares gays abriu em Shinjuku.
Hoje, mais de 200 bares gays estão espremidos num labirinto de ruas em Shinjuku Ni-Chome, cada um atraindo uma clientela bastante específica como “debu-sen” (os que procuram homens gordos), “fuke-sen” (os que adoram homens mais velhos) and “gai-sen” (os que se buscam ‘gaijin’ – estrangeiros).
O Japão já deleitou-se com uma história de sexualidade aberta, datando do período Heian quando os samurais e os monges budistas praticavam sexo com rapazes mais jovens. Em dias atuais, saunas oferecem um ponto de encontro para homens gays.
Homens hetero na maior parte da Ásia tocam-se afetuosamente como amigos. E homens japoneses não têm problemas em chamar outro cara de “bonitinho/gracinha” (cute, kawaii, nunca tem uma boa palavra em português).
Mas como provavelmente aconteceria no Oriente, nada disso é estigmatizado ou rotulado “gay”, “queer” ou “homo”.
“As pessoas não saem do armário no Japão, elas entram (People don’t come out in Japan, they come in),” diz Dvorak. “A tendência é achar o seu próprio espaço. Você não precisa se assumir para seus pais ou patrão, a questão não é o quão exposto você pode ficar. É sobre entrar, como juntar-se a um clube. Você acha o seu próprio nicho. O Japão é assim majoritariamente com a sexualidade.”
Ao contrário das sociedades ocidentais, onde as pessoas são instigadas a falar sobre tudo, o Japão tem uma lei implícita de “não pergunte, não conte”, onde muito não é dito, como forma de respeito e educação para eliminar muitos prognósticos embaraçosos ou potencialmente perigosos.
“Em casa, eu me sentia ameaçado em várias situações onde se eu dissesse que era gay poderia perder minha vida,” diz Jonah dos EUA.
“Agressão aos gays não acontece aqui. A vida gay é muito mais confortável porque mesmo um ambiente não-gay é bem menos ameaçador.”
Outra desvantagem notável da vibrante e aberta cena gay de outros países é que esta pode adotar atitutes pretensiosas dentro das comunidades LGBT.
“Nos bares dos EUA, os caras sentam-se com uma cara de quem é bonito demais para que alguém se aproxime.” diz Jonah. Isto raramente acontece no Japão, se é que acontece.
Os gays estrangeiros podem sentir que precisam se encaixar num molde perfeito imposto pela sociedade. Enquanto eles forem designers de interior, bons cozinheiros, espirituosos e estilosos, são bem aceitos. Estes são os tipos representados na TV e na mídia. Um gay gordinho sul americano levando o café na cama para seu amante possivelmente não ganharia tanto tempo “no ar”.
“É uma visão pré-concebida de casamento que parece a heterossexualidade. É repressão. As pessoas que não se encaixam neste modelo não conseguem se encontrar. As pessoas que fizeram este mundo bandeira Arco-íris não abriram espaço para os asiáticos,” diz Dvorak.
“A idéia de liberação é muito importante, a necessidade de ser visto e apreciado. Mas a globalização está tomando apenas um tipo de “gayzice”(gayness) e distribuindo para o mundo todo.”
Como muitos estrangeiros no Japão não sentem a mesma pressão para conformar-se nos ideais de “gayzice perfeita” que eles experimentam em seus países, eles geralmente sentem-se menos inibidos quando aproximam-se dos homens japoneses.
“Se eu vejo alguém que acho bonitinho, eu vou apenas chegar nele e perguntar ‘Oi. Qual o seu nome?’ Nos EUA todo mundo tem tanta atitude, eu nunca faria isso.”
“Os caras que conheço aqui são muito mais jovens, mais bonitos e em melhor forma, mas eu não sinto que estão ‘fora do meu time’. Encontros exigem bem menos esforço.,” diz Jonah. Aqueles que querem construir um relacionamento do mesmo sexo com japoneses em algo de longo termo sentem que é uma tarefa impossível.
“Eu nunca poderia falar com meus pais sobre a minha sexualidade. Eles nunca aceitariam homossexualidade,” diz Ko-Ko deTokyo, que está envolvido numa relação duradoura com um estrangeiro.
“Eles vêem gays na TV mas nunca acreditariam que isto poderia acontecer com eles. Então nunca contaria para eles, para mantê-los felizes.”
E os gays que eles vêem na tv nunca são gays japoneses comuns, como homens de negócios ou políticos, que venham a público para promover um modelo de conduta.
Já que o Japão ainda precisa passar uma legislação para proteger o emprego contra a discriminação contra gays, não é de se espantar que os japoneses não “saiam do armário e sim entrem”.
Enquanto é fácil ser invisível em Tokyo, onde muitos gays casam e têm filhos, mas mantém uma vida secreta para satisfazer o seu apetite sexual, pode ser especialmente solitário no interior onde todos se conhecem.
“Fora de Tokyo, estrangeiros e japoneses sentem-se muito isolados,” diz o voluntário de uma hotline gay no Japão. “Eu recebi muitas ligações de estrangeiros entrando na idade adulta ao mesmo tempo que foram mandados para o fim-do-mundo-ken no Japão para ensinar inglês e sentem-se muito sozinhos. Isto poderia ser uma desvantagem da sociedade ‘não pergunte, não conte’, onde eles nunca dizem e eles nunca vão saber.”
Em adição à falta de modelos de conduta públicos que ajudem às pessoas a sentirem-se menos solitárias, a maior parte da mídia mostra personagens gays estereotípicos para entreter o público hetero.
Por exemplo, a personalidade Razor Ramon HG (Hard Gay), é um hetero fingindo ser um gay vestindo bondage de couro e andando por aí fazendo movimentos pélvicos em qualquer lugar. No mês passado, a fabricante de brinquedos Tomy lançou “Kurohi-gei Kiki Ippatsu,” um jogo onde Razor Ramon esconde-se num barril o qual o jogador finca espadas de plástico até que ele pule no topo (estilo “Pula Pirata”) Alguns acreditam que se houver pelo menos uma esperança de ganhar direitos para casais do mesmo sexo no Japão, Razor Ramon não é a melhor imagem para representar a comunidade gay.
“Estamos corrigindo falsos estereótipos como Razor Ramon que mostra uma falta de respeito e compreensão e estamos tentando educar as pessoas japonesas sobre o avanço dos direitos dos gays pelo mundo,” diz Hiroshi Mochizuki, editor chefe da Gay Japan News, um serviço online de mídia estabelecido há cerca de um ano que correntemente recebe 50,000 hits por dia.
“A falta de conhecimento é o maior problema. Neste momento nós estamos reunindo as pessoas.”
Mochizuki também fundou um grupo chamado Equality, que ele espera que seja registrado pelo governo como uma Organização sem fins lucrativos nos próximos dois meses.
Enquanto o primeiro objetivo da Equality é disseminar a informação para a comunidade gay e hetero, o objetivo de longo prazo é alcançar a legislação contra a discriminação e direitos para casamentos entre pessoas do mesmo sexo.
Ele diz que para fazê-lo espera fortalecer o músculo econômico da comunidade gay trazendo o apoio dos negócios e comércio locais.
Então para os gays no Japão que não sentem-se tão felizes, Equality pode ser o pote de ouro que está esperando no final do arco-íris.
* Gay Japan News: www.gayjapannews.com
* Gay Japan and Japanese Gay Resources and Travel Tips by Utopia: www.utopia-asia.com/tipsjapn.htm
* Japan AIDS Prevention Awareness Network: www.japanetwork.org
* McLelland, Mark; Queer Japan from the Pacific War to the Internet Age McLelland, Mark; Male Homosexuality in Contemporary Japan: Cultural Myths and Social Realities
* Saikaku, Ihara (Schalow, Paul, trans.); The Great Mirror of Male Love
* Leupp, Gary; Male Colors
* Pflugfelder, Gregory; Cartographies of Desire: Male-Male Sexuality in Japanese Discourse, 1600-1950
* Summerhawk, Barbara; Queer Japan: Personal Stories of Japanese Lesbians, Gays, Bisexuals, and Transsexuals
Eu adorei o artigo! Sabe, acho também a mesma coisa. Essa comunidade gay sob a bandeira imperialista do arco íris existe mesmo. Há toda uma pressão pra pessoa sair do armário – eu acho isso ridículo, cada um vive a vida como quer. Vou visitar esses links aí!
BJOS
Mto legal esse artigo! Sempre tive curiosidades sobre como é ser gay no Japãp, pais cuja cultura me fascina. Pena que não tem mais detalhes sobre a legislação japonesa…
Bom, vlw ae pela info! 😀
Sim, eu tive ânimo para ler!!! xDD~
Obrigada pelo trabalho de trazer e traduzir esses artigos. Fiquei curiosa por mais matérias assim.
Detalhe: “pula pirata” do Hard Gay??? *cai da cadeira*
Nossa, muito bom o post.
Eu li tudinho! xD Nem tenho o que acrescentar…
Parabéns pela pesquisa.
Adorei essa matéria 🙂
Interessante como em cada país ser gay ou não tem uma conotação diferenciada. Parece-me, que pela matéria, no Japão ser mais discreto é a prioridade, como a cultura japonesa é na realidade. Senti falta de se falar da homosexualidade feminina, sabemos que no Japão, ser mulher não é muito fácil, mesmo hoje dia, por causa do patriarcalismo. Imagine ser homo e mulher.
É mais fácil ver em fimes ou novelas japonesas caracterização homosexual masculina do que feminina, ainda assim meio caricato.
Agora a foto do rapaz vestindo couro e tachinhas e segurando uma banana está hilária, sinceramente o cara é uma graça 😀
achei o texto muito interessante! Não imaginava que os gays do Japão fossem “simpáticos” sempre os imaginei como seres inacessíveis mesmo entre si 😀
Obrigada pela tradução, li tudo 8D
Obrigada por postar esse artigo!
Muito interessante… ^^
Descobri esse blog por acaso, mas me arrependo de não ter procurado por ele muito antes!!! Estou adorando todos os post que vc anda fazendo (descobri que sou uma fujoshi ^^). Trazer informações sobre o mundo gay no Japão foi uma idéia muito legal, obrigada por sempre procurar nos deixar informados de tudo ^__~
Parabéns pelo seu blog, foi o melhor que já encontrei até agora (tô sendo sincera, viu).
Obrigada, Lila! Andei com uns problemas técnicos aqui, mas assim que possível volto a postar com regularidade. Bom, o Blyme não tem nem dois meses, então acho que você nos encontrou bem rápido. ^.^Volte sempre! Bjos|
Noooosa………….
É muito fácil a gente ter idéias preconcebidas da homossexualidade no Japão, mas somente textos assim (obrigado por traduzi-lo e disponibilizá-lo aqui, Tanko) podem nos esclarecer.
Sobre a homoafetividade no Japão feudal eu já conhecia, embora não a fundo (pesquisarei sobre o assunto), mas sobre o assunto na contemporaneidade não sei praticamente nada.
Também creio que não devemos nos basear nos animes e seriados yaoi/yuri, pois eles são obras de ficção, e, como tal, alteram e muito a realidade. Não são documentários.
Parabéns, Tanko.
oii
eu gosto muito gay.
ok
eu tem orkut.
xau beijo…
O japão já é quase todo gay. Não é de hoje que os japas mudaram sua opção sexual e têm a cada dia mostrado cada vez mais isso, nos seus programas de TV, grupos e bandas de músicas e no próprio estilo de vestuário. É atualmente o país mais gay do mundo precedido pelos seus antecessores os chineses e talvez em 3º os argentinos empatados com os cariocas. O mundo todo tá se tornando mais gay. E com a queda dos preconceitos muitos ainda se revelarão. Pra todo mundo isso não é mais do que o "normal".