Cobertura Anime Friends 2018 – Entrevistas com as Editoras
Neste final de semana aconteceu o maior evento de anime e cultura japonesa do Brasil, o Anime Friends 2018! E eu, Naninha, recebi do Blyme a missão de cobrir o evento como imprensa. Foram semanas de planejamento, começando pela elaboração de um Guia Boy’s Love aonde você podem ler sobre os diversos artistas maravilhosos que estiveram lá.
Apesar da organização nova e de alguns problemas técnicos, o evento foi sensacional. Contando com muitos artistas nacionais e internacionais, autores e ilustradores independentes, exibições inéditas de filmes e documentários, palestras, apresentações com super produções e muita coisa para comprar, era quase impossível visitar todas as atrações desejadas nos 4 dias de Anime Friends. E quantos não foram os espólios incríveis que consegui lá! Após horas de palestras e uma dúzia de entrevistas, estarei compilando em alguns artigos as partes mais relevantes para o mundo yaoi da nossa cobertura. A começar pelas entrevistas que fiz com alguns editores das três maiores editoras que publicam mangás no Brasil!
Editor da NewPop – Junior Fonseca
– Que poder vocês têm na hora de selecionar um título? Vocês têm acesso a qualquer artista ou são limitados às parcerias feitas com editoras japonesas?
Junior: Nós temos que ser aceitos pelas editoras, mas nós que escolhemos qual título vai ser publicado. Não temos limite de acesso às editoras, podemos negociar com qualquer uma.
– Como é a percepção interna das editoras quanto ao mercado de yaoi no Brasil? Existe público o suficiente? Vale a pena investir? Vocês têm planos, ou pelo menos vontade, de investir em mais mangás do gênero yaoi?
Junior: Acredito que a NewPop atualmente seja a única editora que invista pesado no seguimento. Nossos números em relação a yaoi/boy’s love sempre foram satisfatórios, mas ainda é um valor que não dá para se comparar com títulos como No Game No Life e Re:Zero. Mas a gente acredita sim no material e temos muitos anúncios ainda para fazer.
– Nós públicos de nicho estamos abraçando os crowdfundings como uma forma de fazer tiragens certeiras, pois os nossos consumidores são limitados (não gerais como o público de shounen). Nos EUA uma antiga editora de yaoi recentemente tem publicado com sucesso vários títulos por crowdfunding. Existe alguma perspectiva de vocês adotarem esse método e investirem nesse gênero?
Junior: A gente vem analisando como funciona, porque é meio complicado. Você vai estar pedindo dinheiro para o leitor. Mesmo sendo como uma pré-venda, nós temos que estar muito alinhados à editora original. E nem toda editora vai aceitar só publicar quando chegar a tantos volumes vendidos e se não alcançar esse número esquecer o contrato. Mas nós estamos observando o que vem acontecendo lá fora.
Editor da Panini – Diógenes Diogo da Silva
– Que poder vocês têm na hora de selecionar um título? Vocês têm acesso a qualquer artista ou são limitados às parcerias feitas com editoras japonesas?
Diogo: Só para deixar claro antes, como sou só editor eu normalmente não participo das negociações. Geralmente a gente tem acesso a qualquer título. A questão é que alguns autores são mais limitados, não dão brecha para negociação. As vezes eles não querem negociar aquele título naquele momento. Vai ter um anime, eles querem segurar aquilo. Então alguns são mais fáceis que outros, depende da editora, do autor, são muitos os processos que estão envolvidos nisso.
– Como é a percepção interna das editoras quanto ao mercado de yaoi no Brasil? Existe público o suficiente? Vale a pena investir?
Diogo: Eu posso falar pela Panini. Eu vejo que a NewPop investe e eu acho muito bacana. Eu leio yaois. Eu acho que tem material muito bom, a gente vive indicando. Mas infelizmente a gente ainda tem uma barreira, né. Então a Panini principalmente ainda tem um pé atrás, o máximo que ela tenta trazer é um shounen-ai, uma coisa assim. Mas ainda assim ela encontra uma dificuldade. Tem público, a gente sabe que tem público, mas acho que ainda precisa um trabalho para saber como trazer esse público para a gente, para podermos ter certeza na hora de investir. Foi o que o Levi falou dos outros mangás, né. A gente tem que pisar firme primeiro para depois tentar arriscar uma outra coisa.
Naninha: Sempre é mais seguro um shounen.
Diogo: Exatamente. Porque querendo ou não é o mercado, então a gente tem que ir com calma. A gente espera que possa trazer, que a Panini possa estar investindo também em títulos yaois.
– Vocês têm planos, ou pelo menos vontade, de investir em mangás do gênero yaoi?
Diogo: Eu não posso falar pela editora, mas como editor eu adoraria. Já sugeri alguns títulos. Recentemente sugeri Hidamari ga Kikoeru, que é um shounen-ai. Mas é difícil. Interesse a gente sempre tem, sempre tenta indicar, mas é difícil.
– Nós públicos de nicho estamos abraçando os crowdfundings como uma forma de fazer tiragens certeiras, pois os nossos consumidores são limitados (não gerais como o público de shounen). Nos EUA uma antiga editora de yaoi recentemente tem publicado com sucesso vários títulos por crowdfunding. Existe alguma perspectiva de vocês adotarem esse método e investirem nesse gênero?
Diogo: Sendo sincero eu acho que pela Panini é muito difícil. Acho que a Panini por ser uma multinacional, por ter uma série de questões de negociação mesmo, acho que para ela é bem difícil no momento. Nos Estados Unidos tem a questão de que eles têm um acesso mais direto aos autores e as editoras. Tem intermédio diferente daqui do Brasil, então abre essa possibilidade. Não é impossível, pode ser que alguma outra editora se interesse pela ideia, mas para a Panini eu acho bem difícil.
Editores da JBC – Marcelo Del Greco e Ed Carlos
– Que poder vocês têm na hora de selecionar um título? Vocês têm acesso a qualquer artista ou são limitados às parcerias feitas com editoras japonesas?
Marcelo: Na verdade escolha de título é uma decisão conjunta. São vários departamentos: produto, conteúdo (departamento editorial), marketing. Que obviamente tem que passar pela nossa diretoria. Teoricamente a gente tem acesso a todos os mangás, desde que esses mangás estejam disponíveis para o mercado brasileiro. As vezes tem título que a gente gostaria de trazer que não está disponível, o Japão não quer licenciar, então não tem conversa.
– Como é a percepção interna das editoras quanto ao mercado de yaoi no Brasil? Existe público o suficiente? Vale a pena investir? Vocês têm planos, ou pelo menos vontade, de investir em mangás do gênero yaoi?
Marcelo: Valer a pena, pode ser que sim, mas depende. A gente já fez uma tentativa no passado, a gente lançou Gravitation. Acho que foi o primeiro título yaoi que veio para o Brasil. Inclusive quando a gente publicou ele foi um dos primeiros títulos a virem em tanko, versão de 200 páginas, mas ele não teve o alcance que a gente imaginou. Por isso que o reflexo foi de não vir mais títulos, mas isso naquele momento.
Naninha: Isso há 10 anos atrás. Já mudou o mercado, não é?
Ed Carlos: Mas então entra uma coisa na questão da escolha de títulos, por exemplo. São várias listas que rolam na JBC, baseadas em pedidos que acontecem em redes sociais, em situações que a gente vê no mercado. Naquela época Gravitation deu uma tendência, pareceu uma boa ideia. Ele era muito pedido. Mas acontece bastante isso em questão de mangá, as vezes as pessoas pedem muito um título e quando ele chega os fãs não o apoiam. “Já li no scan, não preciso mais ler”.
Marcelo: E não é uma questão específica com yaoi, é com qualquer título de qualquer gênero.
Naninha: Na palestra com a NewPop hoje e eles falaram que com Loveless foi exatamente a mesma coisa. Todo mundo pedia e quando veio para cá as pessoas não compraram.
Marcelo: Existem alguns fatos históricos dentro desse mercado, por exemplo Kamen Rider Black RX. Era uma das séries mais pedidas, insistiam muito para o pessoal da distribuidora trazer, mas quando trouxeram não deu audiência. Não tem como explicar. É a mesma coisa, Gravitation a gente trouxe e não teve aquela pegada.
Ed Carlos: Sobre essa história do Loveless, eu escutei isso de um logista: “Eu curtia muito Loveless, mas não indicaria esse mangá para trazer”.
Naninha: Ele é meio polêmico.
Marcelo: Dependendo da época, do momento, hoje lançar o Gravitation talvez não causasse a surpresa que foi lançar naquela época. A gente está vivendo um outro momento. Dez anos atrás pode parecer “nossa é pouquinho tempo”, mas mudou muita coisa. A recepção de Gravitation hoje seria diferente, mas é um mangá que já saiu, já deu uma datada e não foi um grande sucesso. Enfim, a nossa ideia é sempre estarmos abertos a todas as possibilidades. Não só a yaoi, também yuri, gekiga e outros gêneros. A gente teve grandes sucessos de soft hentai como Love Junkies e Mouse, que a gente hoje não traz mais por um direcionamento da editora. Então tudo depende. Você vê, Love Junkies foi um baita sucesso, foi um sucesso tão grande quanto Love Hina na época. Hoje a gente já não traz mais esse tipo de conteúdo. Então existem vários fatores, não é só pelo gênero. Depende muito do mercado, depende muito do momento, depende do direcionamento que adotamos. Mas a gente sempre tenta trazer o máximo de títulos do máximo possível de gêneros. Formatos diferentes, produtos diferentes, então você encontra na JBC produtos de luxo como Kanzenban de Cavaleiros do Zodíaco, Ghost in the Shell e Akira, até os que a gente chama standard tipo My Hero Academia. Ou Full Metal Alchemist é um intermediário, já é um produto meio de luxo. A gente tem para todos os gostos, gêneros, bolsos, a gente tenta alcançar o máximo possível de público.
– Nós públicos de nicho estamos abraçando os crowdfundings como uma forma de fazer tiragens certeiras, pois os nossos consumidores são limitados (não gerais como o público de shounen). Nos EUA uma antiga editora de yaoi recentemente tem publicado com sucesso vários títulos por crowdfunding. Existe alguma perspectiva de vocês adotarem esse método e investirem nesse gênero?
Marcelo: Não existe não no nosso vocabulário, mas é um pouco mais difícil. Porque para você fazer uma proposta para um mangá no Japão você tem que estipular um mínimo garantido. Então talvez crowdfunding não funcione direito porque você já tem um máximo ali. Às vezes você pode até sugerir, mandar uma proposta para o Japão baseado nisso, em 2 mil, 3 mil unidades. Mas para eles não é interessante, então não vai passar. Mesmo que fale para eles “a gente reuniu 3 mil interessados, talvez a gente consiga até 5 mil pagantes”, para eles ainda é incerto e não é interessante. Então não sei como eles reagiriam a isso. Mas como eu disse, pode ser que em algum momento a gente tente fazer isso? Pode ser, mas talvez não agora.
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2 Comentários
De maneira resumida, mas aparentemente unânime, me pareceu que nenhuma dessas grandes editoras têm realmente interesse em investir em yaoi no Brasil. Uma pena! Parabéns pela ótima entrevista!
Obrigada por comentar e fico feliz que tenha gostado! 🙂 Bem, a NewPop anunciou que ainda tem vários planos com relação a mangás BL, então pelo menos não estamos a ver navios. E temos outras editoras novas no mercado, então nunca se sabe 😉