Editores de BL comentam sobre o futuro do BL (tradução)
Essa é uma tradução do artigo Editorial departments from three BL magazines talk about the future of BL – Forbidden love is outdated!, originalmente publicado em 09/07/2019.
Departamentos editoriais de três revistas BL falam sobre o futuro do BL – o amor proibido está ultrapassado!
Hoje em dia, o gênero BL (Boys Love) não é mais algo que “precisa ficar escondido” como era décadas atrás. Atualmente, uma época em que séries de TV focadas em casais gays fazem muito sucesso e todo mundo conhece o termo LGBTQ, a imagem do BL que as pessoas procuram deve ter mudado bastante comparando com décadas passadas.
Como as obras de BL mudaram ao longo do período Heisei e no período Reiwa*?
*(Nota: Era Heisei é o período da história japonesa que vai de 1989 a 2019, e a era Reiwa é o período atual, que teve início em 2019.)
Conversamos com três editoras das principais revistas BL, LYNX (Gentosha Comics), Magazine BExBOY (Libre) e on BLUE (Shodensha), sobre a indústria BL até o momento atual e o seu futuro.
A equipe editorial de revistas BL escolheu obras de grande sucesso que representam a era Heisei!
── Primeiro, nos diga há quanto tempo vocês conhecem BL e desde quando trabalham como editoras.
Masuda: Eu sou Masuda e sou responsável pela Lynx. Sou editora há 10 anos e conheço BL há 20 anos. Não sabia nada sobre BL até o começo do ensino médio, quando uma amiga me recomendou Gravitation, uma obra que meio que é BL, mas não é BL.
Ezaki: Meu nome é Ezaki e sou responsável pela Magazine BExBOY. Tenho uns 6 ou 7 anos de experiência como editora, e conheço BL há uns 18 anos. Tudo começou quando peguei o livro Mirage of Blaze na biblioteca. A partir daí, virei fã de novels BL, como as obras de Narise Konohara e Noel Ioka.
Kajikawa: Sou Kajikawa e sou encarregada da on BLUE. Acho que tenho 12 anos de experiência como editora. Eu lia muitas revistas de mangá shoujo e minha experiência com BL começou quando vi BRONZE por Minami Ozaki em uma edição da Margaret quando estava na quinta série. Também descobri Mirage of Blaze na mesma época, e agora estou aqui.
── Existe algum padrão entre as obras publicadas nas revistas pelas quais vocês são responsáveis?
Masuda: A LYNX inclui muitos artistas que desenham exclusivamente para nossa revista. Nesse sentido, acho que a LYNX é como se fosse uma Ilha de Galápagos. Por isso acho que muitos leitores ficam entusiasmados com a revista quando leem. Quero expandir a fachada da revista com uma variedade ampla de gêneros BL.
Ezaki: Fico feliz se os leitores da BExBOY verem a revista como uma caixa com vários tipos de BL. A revista inclui obras que apresentam BL às pessoas, e também obras que os leitores assíduos gostam. Embora a fraqueza da revista possa ser a falta de uma palavra exata para descrevê-la, a postura continua sendo a de acolher obras que derretem o coração de uma mulher.
Kajikawa: on BLUE inclui não apenas obras alegres, mas também aquelas com temáticas mais difíceis. A revista se concentra na narrativa, então tem muitas obras que apresentam altos e baixos significativos ao longo da história. A revista enfatiza trazer histórias que valem a pena ler, então as reuniões geralmente envolvem discussões detalhadas (risos).
── Se você fosse dizer obras de sucesso de sua empresa, quais seriam?
Masuda: Sem dúvidas, a série Okane ga Nai (No Money) (arte por Tohru Kousaka, história por Hitoyo Shinozaki), que foi serializada desde o início da revista. Na época, BL não era tão popular como hoje, e essa obra já foi adaptada na forma de anime, Drama CDs e outros tipos de mídia. Acho que essa obra pode até ser considerada como uma das que construíram as bases do BL. A história envolve um seme rico e perfeito com um uke muito puro, mas desatento. A premissa pode parece um pouco exagerada, mas é uma série clássica que todos querem ler e todas as gerações aceitarão!
Koisuru Intelligence de Michi Tange anda bastante popular ultimamente. Não envolve apenas um casal de seme e uke… A história se passa em K-gaseki, no país N, e possui muitos personagens charmosos. Acho que hoje em dia, os leitores acham divertido escolher seus personagens favoritos.
Ezaki: Acho que não podemos falar da Libre sem mencionar a série Finder de Ayano Yamane e Dakaretai Otoko Ichii ni Odosarete Imasu.(DAKAICHI -I’m being harassed by the sexiest man of the year-) série de Hashigo Sakurabi. Ryuichi Asami, de Finder, é um personagem tão impactante que seu nome pode muito bem ser sinônimo de “super seme”. Para as garotas que gostam de se imaginar com seus personagens favoritos, Asami é uma realidade inevitável que as deixará dispostas a perdoá-lo por tudo.
Dakaretai Otoko Ichii ni Odosarete Imasu. é uma obra brilhante e esse brilho permite que todos a leiam sem medo. Os diálogos também são emocionantes porque amplificam cada personagem. A maneira como a história é retratada para que os leitores entendam o charme dos personagens é simplesmente avassaladora.
Algo que podemos dizer sobre as duas obras é que cada volume inclui pelo menos uma ação ou diálogo que os leitores inconscientemente desejam, executados quase como uma montanha-russa emocional. Os leitores passarão por uma catarse ao ler essas obras.
Kajikawa: A série Étranger de Kanna Kii é frequentemente chamada de introdução aos mangás BL. Há poucas cenas de sexo e tem um estilo refrescante, então atinge um público amplo, incluindo leitores do sexo masculino. E também, Momo to Manji por Sawa Sakura, conseguiu chamar a atenção graças à sensação realista da era Edo, baseada em um conhecimento profundo do período, e na descrição do casal que se apaixonou como se realmente existisse naquele período, e se tornou a primeira obra BL a receber o Prêmio de Excelência no 22º Festival de Artes de Mídia do Japão.
Pornographer, de Maki Marukido, foi adaptada na forma de uma série de TV. Ficou disponível no FOD, um serviço de streaming da Fuji TV, e também foi transmitido na TV. Tenho certeza de que a obra atingiu um público completamente diferente do habitual. A série de TV também conseguiu criar fãs empolgados de Pornographer.
── Na época em que Antique Bakery, de Fumi Yoshinaga, foi adaptado para uma série de TV, excluíram completamente o fato de que um dos personagens era gay. Acho que as coisas mudaram muito em comparação com aquela época.
Kajikawa: Os tempos mudaram mesmo. Ossan’s Love e Kinou Nani Tabeta? foram exibidas em canais de TV, e se outra obra virar sucesso, espero que haja um número maior de atores para atuar em adaptações live-action de obras BL (risos). Talvez, agora seja um momento importante na indústria BL.
“Gostar do mesmo gênero” deixou de ser um obstáculo na história.
── Você sente alguma mudança na tendência da sociedade em relação às obras que preferem? Omegaverse é extremamente popular atualmente, e eu gosto também, mas sinceramente, há uma parte de mim que está impressionada em ver como um sistema com regras tão malucas é popular…
Todos: (risos)
── Por que você acha que Omegaverse é tão popular?
Ezaki: Muitos mangás shounen envolvem classes e acho que todos os otakus adoram classes e grupos. Cio e gravidez também são grandes fatores por trás da popularidade do Omegaverse, mas acho que as pessoas admiram o fato de que Omegaverse tem o sistema de classes, ou seja, Alfa, Beta e Ômega, e que a camada superior pode ficar junto com a camada inferior.
Masuda: Dá para ver as relações humanas entre essas classes. Como os personagens não podem existir independentemente, dá para sentir a profundidade da visão de mundo.
── Eu sempre fui um fã do tropo “calouros dominando veteranos”, então entendo a teoria de que Omegaverse é popular por causa do sistema de classes! Eu também adoro quando o Alfa é uke…
Ezaki: O Omegaverse originou-se no exterior, mas de acordo com uma teoria, essa ambientação foi criada para que as posições de seme e uke nunca sejam invertidas…
Todos: Sério?!
Ezaki: Os fãs anglófonos são muito mais tolerantes quanto às posições de seme e uke no casal do que os japoneses, mas fujoshis estrangeiras que queriam acabar com casais versáteis criaram o universo Omegaverse fixar o casal Alfa/Ômega. Como os japoneses gostam de modificar as coisas, eles acrescentaram mais elementos ao Omegaverse… Mas não tenho certeza (risos).
── Agora me sinto mal por dizer que amo quando o Alfa é uke… Existem outras áreas em que vocês veem alguma mudança ou tendência?
Masuda: A teoria de que “certas coisas devem ser feitas de determinada maneira” tornou-se menos restritiva e sinto que a tolerância dos leitores aumentou. Até um tempo atrás, funcionários de escritório ou estudantes eram personagens populares, e havia menos de 10% de outros tipos de personagens. Mas agora, LYNX também está aceitando uma grande variedade de personagens, como deuses, bestas e outros tipos. Por muito tempo houve a ideia de que a fantasia não é para mangás BL, mas agora os animais (teriantropos) e outros personagens do gênero fantasia são populares.
Kajikawa: Como o gênero fantasia é baseado em um padrão diferente da realidade, ele abre espaço para histórias dinâmicas. É possível movimentar o gênero de forma diferente do código de conduta que se alinha ao sentido moderno.
Ezaki: Além disso, embora os teriantropos tendam a ter seus instintos superando a razão, eles geralmente são puros e leais. É por isso que os leitores não precisam se estressar por não querer entregar o uke para um seme teriantrópico.
── A tendência que envolve os LGBTQ se reflete na indústria BL?
Kajikawa: Tenho a impressão de que a representação de um homem gay se assumindo mudou. A cena em que todos ao redor reagem negativamente a ele se assumir pode ser mal vista pelos leitores, dependendo de como é desenhada. Acho que se a cena mostrar abertamente que é óbvio que o homem será rejeitado ao se assumir, dá uma sensação de que é antiquada.
── No passado, muitas histórias apresentavam “amor proibido” em que os homens se sentiam perturbados porque estavam apaixonados por homens. Mas, ultimamente, tenho a impressão de que gostar de homens não é mais uma questão tão preocupante para os personagens.
Ezaki: Talvez seja exatamente porque “gostar do mesmo sexo” se tornou um obstáculo fraco a superar, agora que o Omegaverse e os personagens teriantrópicos são obstáculos que animam a história.
Masuda: Mas tenho a impressão de que o essencial do drama não mudou muito em comparação com o passado. Porque os leitores de todas as épocas estão lendo, torcendo pelo casal e desejando que sejam felizes. O departamento editorial pede, em princípio, ao artista que deixe os leitores felizes no final. Claro, o pedido é feito com respeito à individualidade do artista. Comparado com o passado, acho que agora é mais fácil que histórias que os leitores podem ler em paz ganhem popularidade. Acho que as pessoas estão procurando obras que possam desfrutar em paz, porque agora vivemos em um período instável. Os conteúdos, que não se limitam apenas a BL, refletem o sinal dos tempos.
Ezaki: Muitos dos leitores estão trabalhando. Acho que é natural para eles se sentirem exaustos ao ler um mangá de luta após um dia cansativo de trabalho.
Kajikawa: Isso significa que um seme perfeito que te mima é um personagem popular em tempos difíceis? (risos)
A maneira como os “editores BL” são mudou?
── O que você acha que acontecerá com a indústria BL no futuro?
Ezaki: A faixa etária com certeza aumentará. Como BL é um gênero com um pequeno número de “ex-fãs”, acho que o escopo de leitores e artistas crescerá.
Kajikawa: Mais e mais trabalhos BL para todas as idades estão sendo distribuídos gratuitamente em vários aplicativos e sites, incluindo pixiv Comic, então acho que a indústria BL continuará atingindo um público mais jovem.
Ezaki: Acho que a nacionalidade dos artistas também está se tornando mais diversa. O número de artistas na Coreia no Sul e em Taiwan está aumentando rapidamente e esses artistas que têm uma plataforma sólida em seu país que estão crescendo! Esses autores estão avançando e a indústria BL japonesa provavelmente se expandirá ainda mais.
── Existe um movimento para recrutar artistas estrangeiros?
Masuda: Eles amam mangá japonês e às vezes falam japonês. Então, precisamos ser os únicos a aprender (risos). Mas sim, eu me comunico com autores estrangeiros.
Kajikawa: Atualmente estou na fase de preparação com um autor coreano e ambos estamos fazendo o nosso melhor com a ajuda de um tradutor.
Ezaki: Eu fechei contratos com uns 3 autores estrangeiros e eles são muito bons em japonês.
── Os autores estrangeiros gostam de um tipo diferente de história?
Kajikawa: Na Coreia, o amor destrutivo é um clichê muito comum em filmes e outras mídias. O autor e eu trocamos ideias sobre esse assunto no início, mas não demorou muito para chegarmos a um acordo porque o autor leu muitas obras BL japonesas.
── O número de obras BL japonesas que são traduzidas e publicadas no exterior também tem aumentado.
Kajikawa: A tendência de trabalhos bem aceitos é a mesma na Coreia. Em Taiwan, a arte com traços simples e cores vivas é popular. Na Europa, são populares as obras artísticas fortemente imbuídas da individualidade do autor. Também ouvi dizer que as pessoas na Europa evitam cenas que pareçam estupro.
Ezaki: Também há países que recusam trabalhos com personagens teriantrópicos porque as relações são consideradas “bestialidade”.
Masuda: Editores locais estão dispostos a traduzir e publicar as obras. Mas logo na fase de oferta, eles nos avisaram que, embora queiram publicar nossos trabalhos, existem certas condições que eles não podem transigir.
Ezaki: Por exemplo, eles nos pedem para remover todas as declarações de que um personagem é um “estudante”. Os editores japoneses também estão ficando mais rígidos sobre as representações sexuais que envolvem menores.
Kajikawa: Como hoje em dia os trabalhos são frequentemente adaptados em vários tipos de mídia, acho que a possibilidade surgirá naturalmente para um anime ou uma série de TV live-action que retrata BL ser distribuída mundialmente. Nesse caso, os criadores precisam atualizar a moral nas histórias e acho que isso pode ser dito para todos os gêneros e não apenas BL. Porque espalhar representações que fazem os leitores pensar que está tudo bem zombar de um colega de classe por ser gay é errado.
Masuda: As coisas com as quais devemos ter cuidado aumentarão, mas precisamos pensar que “ser cuidadoso” é o natural a se fazer. Comparado a 10 anos atrás, o grau de reconhecimento do gênero BL mudou consideravelmente, e o ambiente em torno de BL mudará ainda mais nos próximos 10 anos. Não é estranho se uma grande revista para o público em geral serializar um mangá BL, desde que seja uma obra sem nenhuma cena de amor. Kinou Nani Tabeta? de Fumi Yoshinaga, por exemplo, foi publicado em uma revista para rapazes e acho que um fluxo semelhante com certeza surgirá no futuro. Nesse caso, podemos esperar que nós, “editores BL”, sejamos diferentes de como somos hoje.
Kajikawa: Mesmo assim, esperamos poder ser sempre profissionais no que diz respeito a BL!
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