Boys Love!

AVISO DE GATILHO: Essa obra contém cenas de estupro, abuso sexual de menores de idade, coerção, abuso parental, slutshaming.

Classificação: 🍋🍋🍋🍋

Boys Love! é um mangá de Miecohouse Matsumoto, publicado na revista onBlue. Com três volumes no total, na história somos apresentados a três garotos: Nagi, Satoru e Gou. Nagi é um estudante comum que é invejado pelas alunas da escola por ser amigo de dois garotos populares como Satoru e Gou. Logo no primeiro capítulo descobrimos que os dois não querem ser apenas amigos de Nagi, mas sim ter um relacionamento sexual e romântico com ele. Nagi parece não se importar com a ideia, recusando a escolher um dos dois e sugerindo um relacionamento no qual os 3 possam ficar juntos.

Com essa premissa, você pode começar a ler esse mangá e esperar que a história nos leve para um triângulo amoroso com os dois garotos competindo pelo amor do Nagi, focando apenas no lado dele sobre os eventos. Contudo, desde o capítulo 1 vemos que os três garotos e suas circunstâncias são importantes para o andamento da história.

O mangá pode ser inicialmente desagradável para pessoas que não gostem de cenas de sexo logo de cara, já que logo no primeiro capítulo os três resolvem transar. Eu pessoalmente costumo não gostar também, mas nesse caso eu gostei da ordem que a autora nos apresentou. Temos três adolescentes que gostam da companhia um do outro e veem na presença dos outros dois um alívio para as dificuldades do cotidiano que cada um tem. Eles começam expressando seus sentimentos de maneira física para então conversar com palavras.  Foi algo que fez bastante sentido na minha cabeça dentro da história, especialmente se considerarmos que os três são adolescentes com dificuldade de comunicação. Além disso, mesmo mostrando que sexo pode ser usado como forma de machucar também, me deixou feliz ver a autora deixando claro que sexo também é uma forma de demonstrar amor.

Mesmo focando nos três, em certo ponto da história o foco muda para os problemas de um deles, que serve como gatilho para muitos dos acontecimentos. A autora nos coloca no ponto de vista de Satoru, um modelo jovem. Somos apresentados aos diversos abusos que ele sofreu, tanto de maneira física como psicológica, por parte de colegas de trabalho e até da própria da mãe, que projeta suas expectativas nele.

A história dele é a mais pesada de todos os três garotos ao meu ver pois, além dele ser apresentado diversas vezes como estando e sentindo-se totalmente isolado e sozinho, mesmo com a presença dos dois amigos, Satoru também se culpa por tudo que aconteceu. Ele se culpa por ter sofrido violência sexual, por sentir prazer no sexo com Nagi e Gou, duas pessoas que ele gosta. É um cenário que nos deixaria mal com qualquer pessoa, mas lembrando que ele é um adolescente ainda torna tudo pior. Durante diversos momentos da história quis pular no mangá e gritar “NÃO,VOCÊ NÃO TEM CULPA DISSO!!”. Nenhuma vítima tem culpa do que aconteceu com ela e ver um garoto gritando que se sente culpado por isso, se afastando das pessoas que ele gosta, é de cortar o coração.

Os três garotos com suas próprias histórias que são apresentadas ao longo do mangá e como são várias vezes utilizadas mostra o que faz esse mangá funcionar para mim: os três gostam um do outro, tanto como companhia em três, tanto individualmente. Poderia ser um mangá com foco em dois caras competindo pelo amor de outro e no fim decidindo virar um trisal, porquê sim. Com certeza deve ter mangás que funcionam assim. Mas nesse a graça está em ver os três se resolvendo entre si e individualmente, mostrando que é AQUELA dinâmica, dos três juntos, cada um trazendo algo diferente para o relacionamento, que funciona para eles.

Eu não gosto tanto da arte da Matsumoto apenas por questão de gosto mesmo. Algumas cenas de sexo que ela faz parecem mais engraçadas do que sexy e algumas vezes a arte dela me incomoda. Os desenhos coloridos dela são muito mais bonitos na minha opinião, eu adoro as cores claras que ela bota na capa do mangá. Além disso, creio que ela consegue desenhar cenas emocionais muito bem e diversas vezes ela consegue transmitir o desconforto que personagens passam em cenas que são feitas para serem desconfortáveis.

Eu gosto muito de mangás, histórias no geral na verdade, que retratam formas diferentes de relacionamento. Sendo eu uma cria do Brasil, onde o casamento monogâmico homem-mulher ainda é visto como a norma (e digo norma sendo gentil, infelizmente muitas pessoas não tem a liberdade de escolher com quem se casarão ou mesmo se querem se casar/ter um relacionamento), ver relacionamentos que fogem do padrão sendo escritos de forma positiva me agrada bastante. Hoje em dia (2021) virou até um pouco piada falar em trisal e não-monogamia, com diversas discussões, algumas produtivas, outras não, sobre monogamia, não-monogamia, relacionamento aberto, etc. etc. Não é objetivo desse espaço entrar nessa discussão, creio que todos os leitores desse site são maiores de idade que podem tirar suas próprias conclusões individuais.

No mangá somos mostrados porque os garotos gostam um dos outros e como isso faz bem para eles. E mesmo que isso cause até um estranhamento inicial neles, no fim o que fica é a ideia de que amor é bom. Amor é uma expressão de um sentimento de quem cuida de você, que expressa preocupação e que vai brigar com você pelo seu bem-estar. Amor também vai expor você para a(s) pessoa(s) que você gosta de forma a lhe deixar muito vulnerável. E isso às vezes pode ser muito assustador, especialmente se você é uma pessoa acostumada a esconder seus sentimentos.

Amor, que nesse mangá está interligado a ideia de sexo também, não é algo feito para machucar as pessoas que estão envolvidas. Mesmo que cause atritos inicialmente, o importante é buscar a comunicação necessária entre as pessoas envolvidas. Se você consegue superar seus medos e pedir ajuda às pessoas que ama, a recompensa é muito maior. E no fim, é isso que a autora fala que queria retratar. Um amor entre três garotos.

O mangá é licenciado oficialmente em inglês pela futekiya, com o primeiro capítulo disponibilizado de forma gratuita para não-assinantes.