Entrevista: Koogi
Tradução da entrevista que a autora Koogi fez para a revista Wired em 2017. A tradução foi feita do italiano e pode ser lida nesse link.
Muito obrigada a Sabishii pela tradução!
Yoon Bum é um rapaz frágil e excluído, que depois de receber uma pequena gentileza de Sangwoo Oh, o garoto mais bonito e popular da universidade onde frequenta, torna-se totalmente obcecado por ele. Yoon Bum o observa, segue e chega até a invadir sua casa, mas ali descobre uma verdade arrepiante: Sangwoo é um serial killer. Esta é a premissa de Killing Stalking, a webcomic coreana de Koogi publicado em capítulos pela editora online Lezhin em 2016 e se tornou rapidamente um sucesso internacional adorado pelo público, especialmente feminino.
Violento tanto graficamente quanto psicologicamente, o segredo do seu sucesso está no traço cativante, mas especialmente também na precisão com que são descritos os personagens e a relação doentia que os liga. Onde seria muito fácil colocar clichês e uma retórica romântica fora do lugar, a autora – a jovem Koogi tem vinte e poucos anos – surpreende pela sua capacidade de manter habilmente em equilíbrio os elementos da história em uma linha dupla onde tensão e erotismo se entrelaçam, segundo a tradição dos melhores thriller psicológicos.
Pensado para existir apenas na web, a Itália é o primeiro país do mundo a ter uma edição em volumes físicos de Killing Stalking, adaptada pela Jpop e vendida nas lojas de quadrinhos e livrarias.
Encontramos Koogi e seu editor da Lezhin na Lucca Comics & Games 2017, para falar com ela sobre seu trabalho, como foi recebido no exterior e das controvérsias que surgiram.
Normalmente não faço esta pergunta porque é muito banal, mas no caso de Killing Stalking acredito que é quase obrigação: como nasceu a ideia para essa história?
Koogi: “Mais do que um fato ou uma intuição, eu me inspirei no ambiente ao meu redor. Observando os prédios, os becos sujos, as placas, os folhetos amassados no chão, a história nascia dentro de mim sem eu me dar conta”.
Um coisa que chama atenção é a clareza da obra, seja a nível do desenho como da escrita. Tudo é apresentado com muito cuidado e principalmente com moderação. Qual é o aspecto que você mais trabalha, tecnicamente falando?
Koogi: “Tento me concentrar de maneira igual em todos os aspectos do trabalho, mas em particular, eu foco nos espaços vazios. Dedico tanto ao desenho, se não mais, para criar uma sensação de ansiedade e tensão. São parte fundamental da história”.
Killing Stalking não foi pensado para ser impresso no modo tradicional. Houve alguma dúvida quando a Jpop lhe propôs uma publicação física?
Koogi: “No início eu estava muito preocupada! Como você disse, Killing Stalking foi pensado intencionalmente para ser desfrutado na web. Tanto por ser em um formato de rolagem vertical, então a direção é muito cinematográfica. Honestamente, não achei que funcionaria tão bem no papel. Entretanto, quando vi o trabalho feito pela Jpop no primeiro volume, percebi que não tinha com o que se preocupar. Estou muito feliz com o resultado final”.
Killing Stalking é publicado em capítulos semanais, em todos os aspectos, como uma série de TV. Você já tinha uma ideia definida da história e persiste nela, ou decide de capítulo em capítulo?
Koogi: “Eu tinha a história em mente antes mesmo de entrar na universidade, e sempre soube o rumo que seria seguido. Naturalmente alguma coisas mudam à medida que trabalho nelas, mas são poucas. Eu sempre permaneci fiel à ideia original”.
Sei que seu editor também tem um papel fundamental nisso.
Lezhin: “Depois que Koogi, com Killing Stalking, venceu a segunda competição pela melhor revelação em história em quadrinhos do Lezhin, sentamos com ela e conversamos sobre como a história continuaria, dos planos que ela tinha para o enredo a longo prazo. Como os quadrinhos são divididos em temporadas, como um programa de TV, primeiro nos concentramos primeiro nos detalhes da primeira temporada, depois da segunda e assim por diante, mas sempre com a ideia geral bem presente. No momento, estamos discutindo os detalhes da terceira temporada. No entanto, em geral, sempre a deixamos livre para se expressar como acha melhor. Nosso trabalho é apoiá-la, não controlá-la”.
Killing Stalking é explícito, violento e também honesto em mostrar certo tipo de sentimentos e instintos obscuros do ser humano. Tratando de temas muito complexos e delicados, bastaria uma abordagem superficial, ou mesmo ingênua, para transformá-lo em um produto medíocre. Você teve alguma preocupação sobre isso quando começou?
Koogi: “Eu tinha só uma, apenas de não cair em uma romantização fácil da dinâmica vítima/agressor, como costuma acontecer em outras obras, de filmes a quadrinhos. Racionalmente, não me dei conta naquele momento, mas inconscientemente pensei: “não posso cair nesse erro!” – isso me acompanhou desde a primeira fase”.
Esperava este sucesso internacional?
Koogi: “Absolutamente não. No início não esperava sequer poder vencer o primeiro lugar na competição do Lezhin com uma história assim. Não pensava ter sucesso na Coreia, muito menos no resto do mundo. Sou muito grata a todos os fãs por esta oportunidade”.
Você acha que existem diferenças no modo com que fãs coreanos e ocidentais abordam Killing Stalking?
Koogi: “Em muitas coisas são parecidos, mas a diferença mais evidente para mim está no fato de que os fãs estrangeiros, diferentemente dos fãs asiáticos, “ruminam” muito sobre a história. Significados, futuros desenvolvimentos… por exemplo, fazem teorias sobre o que pode acontecer, ou tentam explicar o porquê de coisas que já aconteceram. É algo que os leitores coreanos tendem a fazer menos. O meu objetivo permanece, de qualquer maneira, de criar uma história fascinante para todos, independentemente das diferenças culturais”.
Por que você acha que as mulheres em particular gostam tanto de Killing Stalking?
Koogi: “Um motivo evidente é o fato de que o gênero Boy’s Love (mangá homoerótico nascido no Japão, escrito por mulheres para mulheres) é muito popular entre as leitoras, mesmo nas versões mais obscuras. Mas creio que seja sobretudo a caracterização dos personagens que as encanta. Além disso, há um discurso de formato. O Boy’s Love japonês vive ainda principalmente no papel, então é preto e branco e sai mensalmente. O coreano, ao contrário, é principalmente online, é colorido e sai semanalmente. É uma experiência próxima à série televisiva, neste sentido, e creio que as leitoras são apaixonadas por isso também”.
Já sabe como acabará a história?
Koogi: “Sei muito claramente, mas como eu quero que os leitores continuem me acompanhando até o fim, naturalmente não vou revelar para ninguém (risos)”.
A censura na Coreia do Sul é muito restritiva. Como editora, Lezhin teve problemas com o conteúdo forte de Killing Stalking?”
Lezhin: “Quando lemos pela primeira vez o quadrinho, durante a competição, ficamos preocupados, é inútil negar. No final, no entanto, tivemos coragem e decidimos premiá-lo mesmo assim porque acreditamos no talento da Koogi e na sua capacidade de contar essa história com habilidade. Em certo momento, recebemos um pedido de esclarecimento do órgão de censura do Estado. Mas, no final, conseguimos provar que o que Koogi estava fazendo estava no seu pleno direito de expressão artística”.
Lezhin é uma realidade online muito particular: os leitores se registram e compram ocasionalmente os novos capítulos das histórias que acompanham. Como vocês escolhem seus autores?
Lezhin: “As competições são sempre valiosas. Mesmo entre os autores que, por qualquer razão, não ganham o primeiro lugar, estão escondidos talentos com os quais igualmente escolhemos trabalhar. Também fazemos buscar dentro na área, por exemplo, visitando escolas de quadrinhos e outros eventos onde é possível ver obras de artistas emergentes. Às vezes, também trabalhamos com autores já estabelecidos nas editoras tradicionais, mas que querem experimentar o formato webcomic. Também oferecemos a possibilidade de submeter os trabalhos diretamente no nosso site e assim recebemos várias propostas de outros países para além da Coreia, como Japão e Europa. Após o sucesso de Koogi, essas propostas multiplicaram, porque nos tornamos mais conhecidos no exterior”.
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